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quinta-feira, 6 de março de 2014

Nem Freud explica!

 

   
      Meu coração batia tão forte e rápido que eu sentia a pulsação em meus dentes. Meu coração batia descompassado como quem tem pressa de viver mas quer que tudo passe devagar. "Menina, coração pesado automaticamente puxa a boca para baixo e os cantos para o alto. Isso forma um sorriso" foi o que eu ouvi um dia no trem. Talvez seja isso. Ou talvez a filosofia da velhinha não passe de lenda.
    Encostei meu rosto no metal frio da porta do trem e contei quantas coisas aleatórias eu via e me fazia lembrar dele. A construção no trilho do trem me fazia pensar nele. Uma voz aguda falava sem parar dentro do trem mas não tinha dono algum, ou melhor, não tinha um dono visível. Me lembrava ele também. Abri o meu livro surrado e a primeira palavra que eu li foi estrelas e isso me fez lembrar ele também. Não me pergunte a razão! Minha mente é uma armadilha, um labirinto onde todos os caminhos resultam no rosto dele, no cheiro dele. Ah, o cheiro dele. Eu queria costurar aquele cheiro em minha pele. Eu queria que ele fosse real.
        Quando a gente se desencontra da gente mesmo, acaba criando situações estranhas. Você não sabe o que é real e o que não é. Talvez seja um desses caras que você vê parado em algum lugar e se apaixone aleatoriamente. Ou talvez seja fruto da sua imaginação. Ou talvez... talvez você esteja louca mesmo, pode ser. Se eu levar em consideração que ele é produto da minha mente, eu posso modificá-lo ao meu modo. Então para mim, ele adora ouvir MPB, gosta de dançar juntinho mesmo sem música, tem cicatrizes de tanto que caiu quando criança, cheira a cigarro e loção pós-barba e gosta de usar frases do Bukowski sempre que pode. Ah, ele também gosta muito de mim. Sorrio com esse pensamento.
        A velhinha que proferiu aquele "pensamento" no começo do texto continua falando. Saio do meu torpor individual e íntimo e abro meus ouvidos para escutá-la.
      - Ih Márcia, esse troço tem jeito não. Ninguém merece amar e não ser amado- diz a velhinha para a amiga do lado-, as coisas que parecem fáceis não são e as que são não são, tá me entendendo? Você acha que eu não queria andar por aí me apaixonando que nem doida? Mas não, querida, decidi fazer que nem Ícaro e construir minhas asas. Eu só não alço voo perto do sol mas às vezes, quase chego lá e minhas asas quase derretem. Tô falando tudo isso pra te explicar uma coisa: liberdade é legal. Tenta um dia".
       Liberdade? É um nome bonito. Dá pra chamar de Lili ou de Bê. Soa bem aos ouvidos. Eu posso ser livre, então? Eu posso criar quem eu quiser quando eu quiser na minha mente e achar que essa pessoa ou coisa realmente existe? Como não me aguento de curiosidade e meu coração está batendo forte, me dirijo à velhinha e pergunto:
           - Liberdade é fazer o que você quiser, quando você quiser e como você quiser e não ser taxada de louca/estranha/doida da silva?
             A velhinha me olha e responde que sim e ainda complementa:
            - Ô minha jovem, pega esse seu livro surrado, constrói suas próprias asas e voa. Mas voa como e onde você quiser!
            - Mesmo perto do Sol?
            - É, querida. Mesmo perto do Sol.
            - E se eu criar coisas e pessoas na minha mente e querer achar que são de verdade? Eu tenho essa liberdade?
            - Ô se tem! Vai lá e se a gente se encontrar de novo, me conta como foi.
           Na minha cabeça fiquei imaginando o que seria o Sol. O Sol pode ser a loucura, o desejo, a vontade... Na minha cabeça, o Sol já tem um significado e as minhas asas também. Mas só na minha cabeça. Desço do trem se sentindo encaixada no mundo de novo e sorrindo pois eu guardo um grande segredo. Eu tenho asas e sei o que significa o Sol na minha própria liberdade, dentro da minha própria cabeça. E não vou dividir esse segredo com ninguém. Porque isso é minha imaginação, minha liberdade... minha própria loucura sã personalizada.
           

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