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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Sobre rasgos, palavras não ditas e cores



 Terminou do mesmo jeito que começou. No começo, foi uma explosão de mil e um sentimentos, o barulho contínuo, a loucura cíclica de corações explosivos, a vontade insana de viver acima de tudo. Depois, um hiato que parecia tão ensurdecedor findou aquele capitulo e explodiu em mil pedaços, me explodiu em mil pedaços invisíveis que se espalharam por todos os cantos em que eu andava e eu, a cigana de sentimentos, tinha que recolhê-los sozinha e tecê-los com uma linha com a cor do cheiro da tristeza. Aquele momento se findou e não deu tempo de pedir bis, de dizer adeus.
   Minha alma queimava por dentro pedindo por misericórdia. Ela já não suportava que todo o sistema falhava. Finquei minhas unhas na pele e rasguei-a mas de dentro dela não saiu nada. A alma não é branca, nem preta ou transparente. Era um caleidoscópio de cores que a solidão tem. E todas elas formavam o meu arco-íris pessoal que me torturava por dentro. Achei que eu explodiria nessa minha jornada psicótica mas nada disso aconteceu. Soltei um grito porém ninguém me escutou. Rasguei minhas palmas da mão com os dentes e lá estava ela, com a cor alaranjada do por-de-sol, minha alma. Sorrindo pra mim como quem diz que acha graça na vida. Tampei os buracos em minha pele com todas as palavras que eu não havia dito. As palavras que eu tinha engolido em minha garganta seca e sedenta por um fim. Tampei os buracos direitinho e se você não reparasse muito em mim, perceberia que nem parecia que eu estava vazando sentimentos sufocados.
   Apertei os lábios secos e bem ali, em meio ao fim que originara caos, soltei duas palavras simples mas que pareciam blocos de concreto em meus ombros.
   - Sinto muito.
    Vomitei-as e minha garganta pegara fogo. A culpa me consumia e ameaçava me sufocar como quem se livra de um moribundo. A culpa prometeu-me tampar minhas narinas, fechar meus olhos e beijar-me para que não houvesse mais passagem para o ar abastecer meus pulmões. Prometeu-me também reproduzir uma música de minha preferência bem do fundo da garganta para não atrapalhar o beijo. A culpa silenciou-me e me deixou ali mesmo, na grama não aparada e no dia quente de verão. Ela me concedeu uma dança também mas minhas pernas não aguentariam sustentar-me. Não com tantas palavras não ditas grudadas em meu corpo como uma doença.
   Fiquei deitada na grama alta por muito tempo. Enquanto minha alma procurava um buraco para se libertar e rasgar o que me restava por dentro, um corcel decrépito e doente convidou-me para montá-lo. Em sua crina ele trazia penduricalhos com pequenos quadrados contendo o seu nome.
   Seu nome era Destino.
   Montei-o e cavalguei até encontrar o por-do-sol. Até encontrar o sol que pudesse me queimar até os ossos. Cavalguei-o por tanto tempo que ele e eu acabamos nos desintegrando no tempo, virando pequenos grãos de areia escuros que não seriam dignos de serem lembrados. Quem ousasse pegar um punhado daquela areia sentiria um cheiro de fim, o mesmo cheiro que os domingos chuvosos trazem e saberia que ali passou uma pessoa com uma alma que sentia graça de tudo mas não sabia sorrir.

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